A discussão que anima o Bloco, um modesto contributo



Como é normal, no seguimento de um ato eleitoral, os militantes ou simpatizantes de cada uma das organizações que foram a sufrágio discutem os resultados obtidos pela sua organização. Sei que nalgumas bandas esse costume salutar não existe mas esse é um problema dessas organizações, dos seus militantes e simpatizantes, talvez por estarem peados na liberdade de discutirem a organização de que são filiados ou meros apoiantes, resolveram, e são bem-vindos, também eles participar na discussão em que o Bloco, felizmente, está enredado.
Simplificando a situação, e aqui o importante são as ideias não as pessoas, apenas personificarei os campos para uma melhor compreensão do texto e da situação que ele pretende retratar, temos por um lado Francisco Louçã (com a Mesa e a Direção Política do Bloco) a defenderem uma linha de continuidade ao trabalho que o Bloco tem desenvolvido e apelando a um debate interno "franco e aberto", sem colocar em causa a Direção Política que liderou o Bloco até às eleições e continua a liderar para lá delas. No outro lado, está Daniel Oliveira, cito-o apenas porque é a cara mais conhecida deste lado, e muitos aderentes do Bloco que defendem a demissão da Direção Política e a convocação de uma Convenção extraordinária para debater não só a responsabilidade da Direção Política na queda eleitoral abrupta, mas a linha política futura do Bloco, ou se preferirem, a sua recentragem política.
Seria cómodo para mim posicionar-me equidistante de ambas as correntes e como Pilatos lavar as minhas mãos. Não alinhando por nenhuma das correntes, não sou neutro e estou de acordo com uns em alguns pontos e com outros noutros pontos.
Resultados eleitorais: cada ato eleitoral é diferente entre si pois cada um é condicionado pelas circunstâncias políticas, sociais e económicas do momento em que é disputado. A condição mais marcante neste ato agora findo, a meu ver, mais que o desemprego, a perda de direitos, a crise... Foi o ódio visceral que os portugueses desenvolveram em relação a José Sócrates. Um ódio que ultrapassou a dimensão política para se estender até à esfera pessoal. Infelizmente os portugueses são mais votados a votar contra o que não gostam que a sufragar as coisas de que gostam realmente. Assim, este ódio a Sócrates refletiu-se nas urnas como uma forte votação no PSD e bastante mais moderada no CDS, por serem, à vista aqueles que mais garantias davam ao eleitorado de um afastamento total e permanente de Sócrates da vida dos portugueses. A ver vamos.
Assim, perante este contexto e contrariamente ao que seria de esperar, os partidos, PCP e Bloco, que se opuseram à intervenção estrangeira, prefigurada na troica, não tiraram dividendos dessa sua posição, nem capitalizaram os seus esforços na defesa dos direitos dos trabalhadores, em votos expressos.
Se o PCP resistiu, elegendo mais um deputado em Faro, distrito que ganhou um deputado, salvo erro a Coimbra, já o Bloco sofreu uma queda brutal, caindo para metade daquilo que obtivera em 2009.
A tendência de muitos comentários tem sido no sentido de comparar os resultados destes dois partidos. Isso não pode nem deve ser feito. Enquanto o PCP é uma organização política histórica, há muito enraizada na sociedade portuguesa e que atingiu ao equilíbrio da sua base de apoio, quero dizer com isto que de eleição para eleição os seus resultados variam pouco, sustentam-se numa base de apoio fixa, mas também revela falta de capacidade em alargar essa base.
Já o Bloco, surgiu há relativamente poucos anos na vida política do país, é ainda um fenómeno novo, ainda que, bem o sei, herdeiro de organizações pré existentes. Assim, isto leva-me a crer que só nestas eleições o Bloco se encontrou com a sua base de apoio fiel. Se ainda tem argumentos para voltar a alargar essa base ou se pelo contrário vai estagnar ou até mesmo perecer, não seria caso único, relembro o PRD, apesar das circunstâncias políticas da sua formação e desenvolvimento serem substancialmente diferentes daquelas que levaram ao aparecimento do Bloco, o seu exemplo demonstra contudo que o desaparecimento de uma organização política que chega a obter grande representação e a aparentar pujança ideológica pode acontecer, mas a resposta a estas questões só o futuro no-las pode vir a dar.
A questão: centremos pois de novo a questão que aqui me traz. No meu entendimento, aqui discordo de Fernando Rosas, quando este afirma que o que Daniel Oliveira propõe é uma Convenção extraordinária com resultado anunciado, a demissão da Direção Política e da Mesa, eu não entendo assim.
Em política não me interessam as pessoas que dirigem determinado movimento político, mas o que esse movimento representa politicamente e qual a ideologia que se propõe defender e aplicar à sociedade. Julgo não estar enganado ao dizer que aquilo que nos faz todos os dias andar, no Bloco de Esquerda, é o trilhar do caminho do Socialismo, um Socialismo em Liberdade e Democracia, por oposição ao Capitalismo e ao Socialismo Totalitário que outros defendem.
No entanto para executar as ideias políticas são necessárias pessoas e a questão que se coloca é se os atuais dirigentes políticos do Bloco são de entre nós os mais capacitados para levar a cabo esse trabalho, não esquecer, o caminho do Socialismo.
Não colocando as pessoas em causa nem duvidando do seu trabalho, em nome do debate franco e aberto que parece todos quererem, seria de bom-tom que a direção política colocasse os seus lugares à disposição e convocasse a tal convenção extraordinária.
Poucas dúvidas tenho que do debate a haver a direção saída da convenção extraordinária seria muito parecida com a atual. Perguntarão, então para quê gastar tempo e energias numa convenção extraordinária se tu mesmo reconheces que a direção saída dessa convenção seria igual à atual? Uma questão de legitimidade democrática! Não é normal em democracia, ainda que capitalista, uma organização política perder metade do seu anterior eleitorado e os seus dirigentes continuarem a considerar-se legitimados pelo passado.
Finalizando, penso mesmo que a atual direção política do Bloco é quem mais tem a ganhar tomando a posição atrás descrita, demissão e convenção extraordinária, perdendo esse debate abre as portas para que os seus críticos tomem as rédeas do Bloco e demonstrem que sabem fazer melhor, ganhando encontra uma nova legitimidade e força junto dos aderentes que retirará credibilidade às críticas mais acintosas durante muito tempo.
Jaime Crespo

 

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